sábado, 4 de dezembro de 2010

Santa Bárbara, Oyá, Sógbó e Gbade.


"FESTA DE SANTA BÁRBARA/IANSÃ

A religiosidade do povo baiano deveria servir de exemplo de tolerância ao mundo. Em que lugar do planeta uma santa católica comunga a mesma identidade de uma entidade essencialmente africana? É assim, no dia 4 de dezembro, que católicos, adeptos do candomblé, umbanda e outras religiões celebram Santa Bárbara e Iansã numa das festas mais disputadas do calendário religioso de Salvador. Iniciada, como em outras festividades religiosas, com uma alvorada de fogos às 5 horas da manhã, acontece na Igreja de Nossa senhora do Rosário dos Pretos uma missa às 7 horas. Devido ao numeroso público, é realizada também uma missa campal. Finalizando os festejos, a imagem de Santa Bárbara deixa a igreja seguindo em procissão até o quartel de bombeiros na Barroquinha, onde faz uma parada para seguir adiante até o Mercado de Santa Bárbara onde é servido um caruru para a população. O caruru de Santa Bárbara é realizado em diversas localidades da Cidade, alguns batem recorde na quantidade de quiabos anualmente. A devoção à Santa Bárbara, padroeira dos bombeiros, enche as ruas de vermelho, incendiando as ruas com fé, regada a muita cerveja.



FÉ QUE DESABROCHOU QUAL FLOR – Por Gloria Kaiser


Bárbara sabia que seu pai jamais admitiria uma cristã em sua casa, mas não temia mais a sua ira; ela confiava no "Pai Nosso". E para que seu pai, ao voltar, pudesse identificar de longe que sua filha tornara-se cristã durante a sua ausência, ela mandou abrir uma terceira janela na torre.
Maximino Dióscoro enfureceu-se de raiva e decepção. Somente neste momento ele reconheceu que havia colocado dentro de sua casa uma cristã, Lydia. Que havia se concentrado apenas no seu perfeito conhecimento de grego quando a escolheu, e que não havia se dado conta de que ela vinha da cidade em que Paulo de Tarso havia traduzido para o grego As Visões de Jesus. Saulo/Paulo era o "perigoso" propagador do cristianismo. No auge de sua ira, Dióscoro quis mandar matar Lydia, mas esta conseguiu fugir. Bárbara igualmente tentou fugir, mas foi encontrada pelos servidores de seu pai e levada a julgamento. Foi-lhe dada a oportunidade de negar ser seguidora da nova religião, o que ela não fez. Foi então, torturada, tocada nua pelas ruas, blasfemada e teve seu corpo cruelmente mutilado. Bárbara, entretanto, resistiu a todos os ferimentos; a limitação da torre, e a autoridade de seu pai não contavam mais; as dores físicas não contavam mais, pois o seu espírito, o seu horizonte havia se expandido, ela passara a viver na firme convicção daquele amor com o qual o trino Deus a nutria e fortalecia. Somente o seu corpo estremecera; o seu interior permanecera inatingível aos seus executores. Quando, finalmente, não aceitou se reconverter aos deuses gregos, apesar de todas as torturas sofridas, ela foi condenada à morte. Em Izmit, porém, não se encontrou um único verdugo pronto a executar a pena de morte, pois secretamente muitas pessoas já haviam se tornado seguidoras da nova "religião do amor". O juiz determinou que Maximino Dióscoro, o próprio pai, executasse a pena. Após a publicação da sentença, Bárbara foi mantida presa numa cela por mais 20 dias; uma última oportunidade concedida pelo juiz para que negasse a nova religião, para que se reconvertesse. Ao ser conduzida pelo pátio da prisão, Bárbara viu os ramos pendentes de uma cerejeira e pediu ao guarda que lhe apanhasse alguns dos ramos. Levou os ramos consigo para a cela, onde, então, se prepararia para a sua derradeira hora. Bárbara orou, falou com anjos, com seres divinos que acreditava perceber em sua cela. E no vigésimo dia, no dia em que seria levada ao cadafalso, os botões dos ramos da cerejeira desabrocharam: o céu enviara o seu sinal a Bárbara! Ela havia escolhido o caminho certo, havia conseguido libertar-se do poder de seu pai através da força adquirida na nova religião, e a sua liberdade interior havia desabrochado. Bárbara não olhou para seu pai quando posicionou a cabeça sobre o cadafalso para a execução. Manteve-se calma e deixou-se ser amarrada. Agora Maximino Dióscoro, o pai, podia exercer todo o seu poder sobre sua filha Bárbara, e assim consumou a pena. No momento em que a cabeça de sua filha separou-se do corpo, no entanto, um raio atingiu Maximino Dióscoro matando-o instantaneamente. As pessoas que levam ramos de cerejeiras à igreja pedem a Bárbara que lhes indique um caminho que as liberte da limitação e do isolamento; Pedem ajuda para encontrar um novo começo. Rezam para que os botões dos ramos de cerejeira abram em flor, apesar de ainda ser dezembro na Europa, de os dias ainda estarem curtos e escuros, e de a natureza ainda mostrar-se enrijecida de frio. No silêncio das semanas de advento, as pessoas conduzem o olhar para dentro de si, oram e pedem pela luz que lhes ilumine a vida, que lhes aponte o seu próprio caminho para a liberdade. E através de sua fé em Santa Bárbara, os botões desabrocharão, e o novo, a brancura da floração da cerejeira, iluminará a neblina, a escuridão. Geralmente Bárbara é representada por uma torre com três janelinhas, que simboliza a reconciliação e a renovação da vida. É a padroeira dos montanhistas, geólogos, arquitetos e artilheiros, dos bombeiros e dos presidiários. Ela também é reverenciada como a padroeira dos moribundos, pois lhes tiraria o medo de morrer - virão anjos que aplacarão as dores da morte. A Igreja dos Romeiros em Eibingen, na região do Rheingau, na Alemanha, guarda uma relíquia de Santa Bárbara.
Gloria Kaiser é escritora austríaca, sócia correspondente do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia e do Instituto Genealógico da Bahia e membro correspondente da Academia de Letras da Bahia.
Fonte: A Tarde, 01.12.2007, Cultural, p.11, Gloria Kaiser


LENDA DE IANSÃ - por Luiz Carlos Pereira

Oxaguiã em certa ocasião decretou guerra a todos seus inimigos. Como eram muitos, precisava de muitas armas. Pediu a Ogum que as forjasse, delas dependeria sua vitória ou derrota. O ferreiro se pôs a trabalhar com sofreguidão, mas tantos eram os armamentos necessários que sua forja já não dava conta. Iansã, sua mulher na época, ofereceu ajuda e começou a soprar a forja para que o fogo se avivasse e Ogum pudesse continuar seu trabalho. Esse esforço conjunto fez com que as encomendas saíssem à perfeição e assim a guerra foi ganha. Oxaguiã, contente e agradecido, resolveu fazer uma visita ao casal reconhecendo o valor do trabalho feito por eles. Ao conhecer a bela mulher ficou totalmente apaixonado e tudo fez para que ela o acompanhasse. As belas e encantadoras promessas feitas em sussurros encantaram Iansã e ela se foi com o rei para seu castelo deixando Ogum desanimado e tristonho. Anos mais tarde nova guerra foi decretada. Oxaguiã correu a casa do ferreiro para fazer nova encomenda, conhecia e respeitava o trabalho de Ogum, este, porém o recebeu friamente dizendo que desta vez já não contava com o valioso sopro de Iansã o que deixava sua forja fria para o feitio de tantas armas. O rei garantiu-lhe que teria o sopro necessário. Chegando ao seu reino ordenou à mulher que ajudasse Ogum, mas teria que ser dali, não poderia voltar ao velho lar. Depois de muito pensar no que fazer, Iansã sentou-se em frente a uma janela da torre mais alta da construção e começou a soprar. Primeiro em pequenas baforadas que apenas faziam brisa. A casa do ferreiro ficava do outro lado da terra e o sopro a ser enviado tinha que ser mais forte. Concentrando-se em sua tarefa, puxava o ar e o soltava cada vez com maior ímpeto. Em pouco tempo o sopro transformou-se em vento que balançava as folhas das árvores. Ao cair da tarde transformara-se em um tufão que varria todos os campos e terras por onde passava e chegava à forja de Ogum com a força necessária para avivar o fogo tão necessário. Reconhecendo o esforço da mulher querida, ele se pôs a trabalhar com afinco. Pelas cidades onde os ventos passavam todos habitantes prostravam-se em terra para louvar a tempestade da bela Oyá. Foi assim que Oxaguiã venceu a guerra novamente, usando o trabalho do casal que ele separara. Ainda hoje, quando há missões especiais, Ogum se põe em frente à forja e Iansã de sua torre sopra com energia. Separados por quilômetros de terra, encontram-se a força e a tempestade!

Fonte: http://pt.shvoong.com/humanities/religious-studies/1679573-lenda-ians%C3%A3/
(...)"

Fundação Gregório de Mattos; In: http://www.culturatododia.salvador.ba.gov.br/festa-modelo.php?festa=5

Em algumas tradições minas no Brasil, Santa Bárbara é sincretizada com Gbade, em algumas casas com Notché Sógbó (nossa mãe Sobô), vodum do branco, daí o amarelo de algumas contas que surge do vestido de Bárbara, em alguns casos presente também o azul do ráio; em Jeje Mahi, Modubi, Savalu (Jeje Nagô) e no rito Nagô-Vodum onde Sógbó é adan (corajoso, colérico) e de caráter masculino, vodum do vermelho, o sincretismo é com Oyá como no Nagô.
O caruru servido em sua festividade lembra que Oyá é mãe dos gêmeos Ibeji (Hoho; Hohovi).

Que Oyá, Gbade, Notché Sógbó e Santa Bárbara nos abençoe.
Yao!

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